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Nina Lemos

Quando uma mulher deve começar a mentir a idade? Nunca!

Nina Lemos

30/08/2017 04h00

Madonna: linda, livre, leve e solta, no baile do MET Gala, em maio deste ano. (Foto: Getty Images)

Prestes a fazer 35 anos, minha amiga pergunta: "quando eu devo começar a mentir a idade?". Rio, enumero todos os amigos com mais de 50 que temos em comum e que não, não viraram alienígenas. Tento convencê-la de que não existe uma idade em que se passa a mentir. E nem essa história de mentir. Por que mentiríamos se nem fizemos nada de errado?

Outra amiga, essa de 52, me conta uma história: ela estava ficando com um cara de 20 e poucos anos em uma festa (sim, amigos, isso existe! Mulheres de seus 50 têm, sim, uma vida. Se solteiras, claro, elas paqueram, ficam. Elas, inclusive, são humanas. Assustados?). Enfim, essa minha amiga comentou com uma colega de 30 e poucos que o tal cara a tinha a convidado para ir a casa dele. "Mas você mentiu a idade, né?", perguntou a guria de 30. Que mundo é esse onde uma mulher diz para a outra mentir a idade?

"Ah, para não assustar o cara, tadinho!". Estamos, a essa altura do campeonato, preocupadas com isso? E vamos fazer o jogo sujo de que mulher para ser desejada tem que ser para sempre linda e fresca?

A idade chega para todos. Mas vale inverter o gênero. Desde quando um homem hétero pergunta ao outro qual é a idade certa para começar a mentir a idade? E já pensou se um cara diz na balada que vai para a casa de uma garota e o outro pergunta, preocupado, se ele mentiu a idade? Como diz a Madonna, a cantora de 59 anos que virou militante da causa contra preconceito com envelhecimento, "uma mulher, para ser aceita, não pode cometer o crime de envelhecer."

Tem quem ache que a Madonna ficou louca. Outros que ela tem "coragem". Acho que ela apenas continua sendo a Madonna.

Ô, coragem…

Quando falo publicamente que tenho 46 anos dizem que eu sou "corajosa". Alguém diz o mesmo para meus amigos 10 anos mais velhos que eu quando eles assinam "56 anos" na orelha dos seus livros e posam, meio grisalhos, meio carecas, fazendo pose de intelectual? Não.

Corajosos, serão chamados, se assumirem um relacionamento com uma mulher mais velha. "Esse aí tem coragem", ri o sujeito que considera as moças 10 anos mais jovens que eles "velhas demais" para um relacionamento e as chamam de "caídas". É tão ridículo. E atinge todas nós.

"Todos assistimos James Bond e percebemos que ele vai ficando cada dia mais velho, enquanto suas namoradas vão ficando cada dia mais jovens", declarou a atriz Helen Mirren, de 73, mais uma das inúmeras mulheres de Hollywood a lutatem contra o ageísmo.

Ah, mas agora vocês vão vir com esse mimimi de ageísmo? Sim! Para quem não sabe, ageísmo é o preconceito em relação a idade. Julgar alguém o chamando de velho, datado, antigo, etc. Sugerir que alguém minta a idade, além de indelicado e cafona, é preconceituoso para caramba!

O problema, no caso das mulheres, parece estar mais na mente de quem imagina o horror que deve ser passar dos 40 (Socorro! Meu deus!) do que na cabeça daquelas que já fizeram a tal festa para comemorar os 40. Elas se divertiram, acordaram no dia seguinte e viram que continuaram iguais. Rá!

Uma pesquisa realizada pelo Instituto Avon ano passado com mulheres de mais de 45 anos revelou que 95% delas declaram não mentir a idade. Ufa! Agora, você, amiga de 30, pense outra vez, não caia nessa.

Se a gente tem que ser sempre jovem, a gente está se colocando como mercadoria que não pode passar do prazo de validade. Repito a frase da Madonna: "não envelhecer, nunca, isso é um pecado" . O que eu e a Madonna queremos dizer com isso? Ouse, claro! Inclusive porque a outra saída, bem, vocês sabem qual é…

Sobre a autora

Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.

Sobre o blog

Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.