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Nina Lemos

Ninguém tem que nada: famosas e anônimas adotam tendência “sem make"

Nina Lemos

31/03/2018 12h18

Sharon Stone, em foto postada no Instagram

Essa semana vi uma foto da deusa Sharon Stone sem nenhuma maquiagem, com toda a beleza dos seus 60 anos, aqui no UOL. A atriz publicou a imagem em seu instagram totalmente de cara lavada. Sharon engrossou a fileira de mulheres que resolvem se exibir do jeito que são e dizer não para obrigações estéticas do tipo: "se não se maquiar, você é uma desleixada"."Depois de certa idade, então, não ouse!"

Em tempos de filtros e aplicativos de celular que transformam peles e fazem todos ter meio a mesma cara (de personagem de videogame), a atitude de Sharon, se não chega a ser revolucionária, é interessante.

No dia seguinte, foi a vez de Christina Aguilera aparecer sem make e dizer "sim" para a beleza natural, sem retoques. Ela exibiu suas sardas e mostrou outra Cristina, irreconhecível (e não menos linda) na capa da revista "Paper". A cantora disse que se sentiu livre com a experiência, o que não quer dizer, veja bem, que ela nunca mais vá usar maquiagem na vida. Ela de certa forma se despiu. E curtiu.

Assumir os fios brancos já virou tendência (quem diria?). E agora cada vez mais mulheres dizem não para "ter que usar make", "passar um batonzinho". "Tirar a cara de doente". Por que não?

No Oscar desse ano, a atriz Frances McDormand fez o impensável no tapete vermelho das estrelas. Apareceu de vestido de gala, sem make e de cabelos grisalhos. Foi considerada por todos uma das mulheres mais elegantes da noite. E eleita a melhor "beleza" pela implacável Vogue justamente por não usa make. Uou.

Ninguém tem que nada

Cada um usa maquiagem se quiser. Quem não quiser não usa. Simples assim, não? Nem tanto.

Postei a seguinte mensagem no Facebook enquanto pensava em escrever esse texto. "Você parou de usar maquiagem? Fale comigo." Quando olhei minha timeline levei um susto. "Uso!". "Pois eu não uso!" "Vao querer que agora a gente também pare de usar make?" Epa! Tive que usar meu spray anti-treta para avisar minhas amigas que não, não era um campeonato e não precisava existir uma divisão de times tipo com make versus sem make. A gente usa, não usa, faz o que quiser, não é?

Mas percebi ali que, sim, em pleno 2018, usar make ou não usar ainda é uma questão polêmica. Como assim? Em que mundo eu vivo que nem imaginava isso?

"Existe patrulha, sim. Minha mãe, por exemplo, desacredita do jeito que eu saio na rua", diz a produtora Ju Hirchmann, que há alguns anos decidiu dar adeus ao make e ao salto. "Foi por praticidade e também por querer que as pessoas me conheçam como eu sou no dia a dia, acredito na beleza natural", diz.

A artista plástica Marion Velasco diz que tentou se "enquadrar" ao padrão com make a vida toda.

"Acho lindo nos outros. Tenho 57 anos, já trabalhei como stylist e com maquiadores fantásticos e sei que hoje os produtos são mais levinhos, tem mais funções e opções de cores, mas continuo achando lindo nos outros. Assisto aos tutoriais de maquiagem no Youtube, entro em lojas de produtos de beleza e fico enlouquecida com o tanto de cores dos produtos, mas para me ver pintada, só em festa à fantasia", ela conta.

Marion encontrou a beleza que gosta nela mesma recentemente. "No dia a dia, passo hidratante no entorno dos olhos, um kajal preto (tem que ser lápis) para a linha ficar bem orgânica, filtro solar no rosto e protetor labial sem cor." Ela também adotou os cabelos grisalhos. "Recentemente, parei de pintar o cabelo e ostento mechas de fios brancos em volta do rosto. Nos pés não uso mais esmalte, nas unhas das mãos, brinco um pouco com as cores, mas tenho me preocupado com a quantidade de químicos que esses produtos podem ter."

A vendedora Carol Mucio sempre adotou a linha natural. Com direito a todos os tipos de patrulha. "Sempre fui vendedora de loja e senti uma imposição enorme das mulheres que trabalhavam comigo. Como assim você não passa nada? A imposição em geral vem da gerente e todas as vendedoras apoiam. Nunca foi a minha, só passo rímel e lápis e quando estou trabalhando. E o pior é ver que essa pressão vem de mulheres. Esse padrão ainda impera", lamenta.

Todos lamentamos aqui qualquer padrão. E aí vemos que Sharon e Christina podem, sim, fazer uma pequena diferença. Que bom.

Sobre a autora

Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.

Sobre o blog

Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.