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Nina Lemos

Turismo instagramável: a foto é mais importante que o sabor do prato?

Nina Lemos

03/05/2018 04h00

(Crédito: iStock)

Quer fazer a volta ao mundo tirando fotos dos melhores lugares para postar no Instagram? A ideia é meio idiota, mas, se você quiser gastar seu dinheiro dessa maneira maluca, você pode.

E nem vai ser tão difícil. O turismo "instagramável" é um nicho fortíssimo em 2018. E sim, trata-se mais de viajar pensando em ficar bem na foto e escrever nas legendas #ôsorte do que relaxar, conhecer novas culturas etc.

Bizarro? Sim. Mas esperado em tempos em que "se não postei, não aconteceu".

Uma pesquisa recente realizada pelo portal alemão Statista mostrou que o termo #holiday é um dos mais usados no Instagram; e que foi usado em 97 milhões de fotos no App. Ou seja, para quase todo mundo que tem Insta, a viagem e o post estão ligados. E, claro, também a exibição e a busca pelas melhores selfies (um esporte perigoso, que pode matar).

Há um tempo, quando você planejava uma viagem, era normal que um amigo falasse: não deixe de comer a moqueca do bar da fulana, é a melhor da cidade! Hoje, há guias, listas e sites que indicam as melhores comidas, cafés, hotéis… que rendem boas imagens. O sabor, o cheiro, a experiência? Contam menos.

O mundo do turismo de Instagram é cheio de curiosidades bizarras. "Passeando" um pouco por ele descobrimos, por exemplo, que os cincos cafés mais "instagramáveis" do mundo, por exemplo, variam desde um café chic em Londres até um orgânico em Bali. Sim, é difícil entender como um orgânico, um conceito que está ligado mais a coisas gostosas e saudáveis, possa ser usado como algo que… fica bem em uma foto.

Assim como é complicado entender que, por exemplo, um famoso site de millenials moderninhos faça um levantamento de "lugares na Alemanha que foram feitos para o Instagram". Entre eles, estava a Ilha dos Museus, em Berlim, e a Filarmônica de Hamburgo. Chamar um lugar que reúne alguns dos museus mais importantes do mundo de "feito para o Instagram", se é piada, é de mau gosto, me desculpem. Museu é um lugar onde a gente vai para visitar, aprender. Ou era.

E não, não é permitido (ainda) filmar espetáculos de uma filarmônica e colocar no Stories (por favor, não façam isso!).

Super Instagramável

Lembro da primeira vez que ouvi a expressão "instagramável". Estava com amigos em um museu e eles disseram: "o conceito aqui é todo instagramável". Verdade, era um museu de grafite. E, quando reparamos, as pessoas mais posavam com as obras, com a escada de neon, do que olhavam pra elas.

"Realmente tem gente que vai nos lugares só para tirar AQUELA foto. Não entendo muito bem, mas acho que existe todo tipo de viajante, né? Tem quem viaje pra provar algo, e tem quem viaje pra conhecer o mundo mesmo. Se cada um atingir o seu objetivo, quem sou eu pra achar algo?", diz Annix Lim, uma das editoras do site Almost Locals, que, entre outras coisas, dá dicas para que os turistas possam experimentar cidades um pouco como locais.

Sim, cada um busca (e traz) o que quer da viagem. Mas uma ideia: mesmo que você tire uma foto… saboreie o prato. Isso não tem Instagram que mostre.

 

Sobre a autora

Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.

Sobre o blog

Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.