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Nina Lemos

Cientistas confirmam: mulheres se subestimam no trabalho. Até quando?

Nina Lemos

22/05/2018 04h00

 

Crédito: Getty Images

 

"Eu sou uma burra." E o sentimento de falência é tão grande, que já imagino o coro de leitores: "é mesmo!". Há alguns dias li sobre a síndrome do "eu sou uma farsa". Basicamente: me sinto uma farsante sem talento. É, mulheres queridas, quem nunca? Quem nunca, todo mês? Checo nos astros. Checo no meu corpo: culpo a TPM.

Sim, ainda tem essa. Além de nossa educação ter um "gap" que nos faz sentir inferiores e colocar nossas habilidades profissionais e para a vida em cheque (e cientistas tentam entender exatamente que mecanismo é esse), ainda têm os hormônios, que fazem com que uma vez por mês a gente chore de pena de nós mesmas.

Não é só comigo. Mensalmente, uma amiga aparece na minha caixa de mensagens falando "sou uma farsa". Ao mesmo tempo, vejo eu e amigas (ainda) colocando o mérito em Deus quando arrumamos um trabalho bom (foi Deus) ou fechamos um contrato legal (foi um milagre).

Eu tinha a impressão de que esse sentimento atingia mais as mulheres (atenção, eu estou dizendo MAIS; tenho amigos homens que se acham uma farsa também). E, agora, estudos sérios provaram que minha impressão está certa. Existe uma falha de confiança de acordo com o gênero. Resumindo: os homens se acham. As mulheres também se acham  – uma farsa.

Deu no jornal da Harvard

Uma pesquisa feita em março pela Universidade de Cornell (e divulgada pelo jornal de Harvard) concluiu que as mulheres tendem a subestimar suas habilidades, performance no trabalho e no campo intelectual. Enquanto os homens costumam supervalorizar suas capacidades. A gente acha que não é tão boa assim. Eles (estou falando no geral e baseada em pesquisas científicas) pensam o contrario: "sou bonzão". Por quê?

Leio sobre. Penso. Não tenho a resposta exata. O mesmo estudo da Universidade de Cornell concluiu que a maioria dos homens também duvida de si mesmo. Mas isso não faz com que eles desistam. Ao contrário de nós. Outro estudo, esse feito pela Hewlett Packard (empresa americana que é uma das maiores companhias de tecnologia da informação do mundo) mostra que as mulheres só se candidatam para vagas de trabalho quando acham que estão 100% aptas para o emprego. Já os caras, quando acham que estão uns 60% preparados, já vão lá se inscrever. Certos estão eles que se jogam!

Nós, com nossas inseguranças, continuamos ouvindo a voz: "mas quem sou eu para trabalhar no 'New York Times'?'" E aqui cabe um exemplo real. Ano passado, em um grupo de amigas jornalistas no WhatsApp, alguém apareceu com a notícia de que o "New York Times" (o sonho de todo jornalista) estava procurando um (a) editor (a) chefe para o Brasil. Nenhuma de nós se sentiu capacitada. Cada um tinha uma desculpa melhor: "meu inglês não é tão bom", "mas eu estou fora de redação faz muito tempo; melhor você.". Até que eu tive uma revelação e disse: vamos nos candidatar antes que um homem pior que a gente vá lá e consiga!"

Não fomos. Não sei quem ficou com a vaga. Mas nós, todas com mais de 20 anos de profissão nas costas, que não fomos.

Como ninguém sabe o motivo exato para nosso déficit de autoestima, proponho que ao menos a gente fique alerta. Que a gente se obrigue a aplicar para as vagas dos sonhos, que a gente grite com a gente mesmo que não, não somos uma farsa coisa nenhuma. E, claro, que a gente ajude nossas amigas, gritando com elas quando as gênias colocam suas qualidades (tantas!) em cheque. Não é fácil. É um trabalho diário. Quem sabe um dia a gente não para com isso de uma vez?

Sobre a autora

Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.

Sobre o blog

Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.