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Nina Lemos

Homem brasileiro dando vexame machista fora do Brasil: não é só na Copa

Nina Lemos

21/06/2018 13h25

Desculpem dar essa má notícia, mas não é só na Copa do Mundo que um tipo de homem brasileiro (uma minoria, acredito) dá vexame machista fora do Brasil. Sabe aquela coisa de pensar: "ninguém entende a minha língua, então posso falar o que eu bem entender?" Pois é. Um perigo.

Atenção! Não estou falando que só certos homens brasileiros são nojentos quando longe de seus países. Existe gente ogra no mundo todo. Os aviões lotados de europeus para fazer turismo sexual (muitas vezes, com crianças) mostram isso muito bem. É repulsivo.

Mas, com os casos de brasileiros praticando assédio com russas durante a Copa do Mundo (o grupo que gravou um vídeo humilhando torcedoras corre o risco de ser processado pelo governo russo), é uma boa hora para os sujeitos que fazem esse tipo de coisa pararem para pensar e se ligarem. E, sim, a fama de machista dos brasileiros corre o mundo faz tempo.

É maravilhoso tirar férias. Mas estar longe não é desculpa para agir como um machão mal-educado e desrespeitar mulheres, LGBTs, negros. As pessoas não voltam a ter 7 anos quando tiram férias. E, claro, nossas crianças de 7 anos costumam ser mais educadas.

"Aqui só tem viado"

"Aqui, vamos pegar geral, aqui a gente se dá bem porque aqui só tem viado." "É, com esse bando de bicha vai sobrar mais mulher para a gente." Ouvi um grupo de brasileiros gritando isso bem alto na porta de um clube onde grande parte dos frequentadores são gays, em Berlim.

Sim, os caras estavam sendo homofóbicos aos gritos na frente de caras gays e achando (coitados) que iriam se dar bem pegando aquelas meninas que estavam na fila. Ou seja, sendo ofensivos também com elas, que estavam ali para se divertir, dançar.

O lugar era o Berghain, um dos clubes mais famosos do mundo, conhecido por ser uma meca da música eletrônica, ser aberto a todas as orientações sexuais e por ter uma política de barrar gente na porta (por causa da roupa, do cabelo, da vontade do sujeito que barra e do comportamento de quem quer entrar).

Foi com enorme alegria (e alívio, o que eles poderiam fazer lá dentro?) que vi os jovens serem barrados e saírem dali de cabeça baixa, humilhados.

Corta para um show do Criolo em Berlim. Na entrada, dois homens conversam aos berros. "Eu só pego alemã. E tem que ser loira. As alemãs ficam louquinhas comigo!" "É fácil, né? To pegando alemã geral", respondia o outro. Não sei de onde os caras tiram essa autoestima. E, sim, eles estavam sendo, além de machistas, racistas no show do Criolo. No mínimo, incoerente.

Também em Berlim. Uma amiga trabalhava em um bar. Os caras pararam em frente a ela e resolveram discutir o quanto dariam de gorjeta. Um deles disse: "Vamos dar mais porque ela tem peito grande."

Na boa, eles teriam coragem de fazer isso no Brasil? Não teriam medo de, no mínimo, levar uma bronca?

Comer mulher! Comer mulher!

"Uma vez estava em Paris e vi um grupo de brasileiros entre 35, 40 anos, com pinta de executivos, passando gritando: 'viemos aqui para comer mulher'. Detestei entender português naquele dia", diz o arquiteto Marcio Bariane.

De novo, eles fariam isso no Brasil? Que espírito ogro é esse que toma conta dessas pessoas quando longe de suas casas?

Não estou, de forma alguma, falando que todos os homens brasileiros fazem isso. Muito pelo contrário. Não conheço pessoalmente nenhum cara que seja assim. Meus amigos e conhecidos acham essas atitudes repugnantes, constrangedoras e sentem vergonha pelo comportamento alheio (e também são prejudicados, porque ganham fama por causa da falta de noção dos outros). Acho, sinceramente, que eles, os normais, são maioria.

E, do fundo do meu otimismo, espero também que o escândalo da Rússia sirva para muita gente ir para o quartinho, pensar, e melhorar. Sim, eu ainda acredito.

Sobre a autora

Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.

Sobre o blog

Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.