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Nina Lemos

É preciso aproveitar as coisas simples e viver o aqui e agora. Mas como?

Nina Lemos

25/07/2018 04h00

 

 

Foto: Getty Images

Esta semana, recebi a notícia da morte de uma pessoa querida. Uma daquelas histórias que, além da dor da perda, faz a gente pensar em um monte de coisa. Junto com a tristeza e o choque, vem a constatação óbvia. "Isso que é problema, eu sofro demais. Vou aproveitar mais a vida. A qualquer momento eu posso morrer e fico me lamentando. Eu perco muito tempo reclamando. Ela tinha problema de verdade. Sua família tem problema de verdade. Eu, não." Tudo verdade. Mas quem disse que eu vou conseguir aproveitar a vida como eu gostaria?

"A gente tem que ser feliz com as coisas simples", diz minha amiga, também abalada com a notícia. Claro que a gente tem que ser feliz com coisas pequenas. Mas como a gente consegue?

Exemplo prático. Hoje, eu devia estar feliz só porque andei de bicicleta, mas voltei achando a minha vida meio ruim (ainda mais se comparada com a vida maravilhosa e glamourosa das pessoas no Instagram).

O inferno somos nós

Depois de 20 anos de análise, toda a obra do Freud devidamente lida, sei que o inferno não são os outros, mas eu mesma. E, enquanto viva, terei meu superego para me torturar.

Por isso, do nada, como boa neurótica diagnosticada com transtorno de ansiedade, vou perder tempo, mesmo que eu esteja em um lago aprazível, pensando em alguma coisa que deixei de fazer em 2004. E, no futuro, ainda mais com essa crise, imaginando que vou ser uma pessoa miserável e virarei mendiga. Claro, também perco tempo achando que uma tragédia pode acontecer do nada. E me atormento pensando que eu devia estar produzindo mais, estudando outras línguas, escrevendo um livro, ganhando mais dinheiro. No meio disso tudo, ainda acho tempo para pensar que o que faço não é tão bom assim (síndrome do impostor, minha eternal companheira).

"Você tem que viver o presente!", dizem todos, e eu concordo. "É preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã porque se você parar para pensar na verdade não há!", diz o Renato Russo, e eu concordo. Mas… e na prática?

Na prática, queridos, existem centenas de livros de auto-ajuda sobre isso, gente tentando nos convencer que é "feliz no simples" enquanto posta foto de pôr-do-sol no Instagram, toda uma gama de poetas que já cantaram as coisas pequenas e o valor do aqui e agora. E também um monte de gente que, como eu, tenta, mas falha miseravelmente.

Vou viver o aqui e agora, prometo! Aí, um pensamento maluco sobre 2010 aparece na minha cabeça. Sei que não sou a única. Por isso escrevo esse desabafo.

E proponho um desafio que, pelo menos comigo, tem funcionado. Já que eu não consigo viver o só por hoje e a felicidade das coisas simples na minha vida (e nem por um dia todo), estou tentando viver por uma hora por dia. Se der certo, irei aumentando. Tente! Quem sabe um dia a gente não chega lá?

Sobre a autora

Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.

Sobre o blog

Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.