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Nina Lemos

Estão culpando a Ariana Grande pela morte do ex. Ei, não somos rehab!

Nina Lemos

09/09/2018 14h14

Fotomonagem: Mariana Pekin-UOL/GettyImages

Você tem um namorado que se droga e bebe demais. Por esses motivos (e outros), você resolve terminar com o sujeito. Ele morre por causa das drogas… e você passa a ser culpada pela morte dele.

Como? Bizarro? Sim, mas é o que está acontecendo com a cantora Ariana Grande. Seu ex, o rapper Mac Miller, morreu de suposta overdose na última sexta-feira. O que seus fãs fizeram? partiram para o ataque! A cantora seria a culpada, afinal, como se abandona um cara nessas condições? "Você o matou!", "Você é um monstro!", escreveram em seus perfis nas redes sociais.

Pode parar!

Desde quando uma mulher pode ser responsabilizada pela morte de um ex que usava drogas? Bem, desde quando a sociedade inventou que, além de tudo, nós, mulheres, somos mães e enfermeiras dos homens. Temos que aguentar tudo e temos "poder curativo". Ariana, infelizmente, não é a primeira nem a última mulher do mundo a ser culpada por não ter "cuidado direito" de alguém que, escuta, era um adulto!

Ninguém cura ninguém

Sem querer ser cruel com o artista que morreu (uma tragédia a ser profundamente lamentada). O mais esperto a se fazer quando um cara perdeu o controle do uso de drogas é se separar, sim. Se Ariana fosse minha filha, eu daria esse conselho. Assim como já falei o mesmo para várias amigas e até para mim mesma. Isso porque mulher não é REHAB.

Algumas de nós até sofrem da síndrome de rehab e  acham que são a própria clínica de reabilitação. "Comigo  vai ser diferente. Vou consertar esse homem". Spoiller: não funciona.

Já namorei gente com problema com drogas? Sim. Muitas amigas também. E não, os sujeitos em questão não pararam de se drogar porque a gente queria. Por mais que a gente tente e incentive a recuperação, o sujeito só vai se recuperar se quiser (muito, de verdade). E, claro, depois de procurar terapia, médico etc.

O que esperavam que ela fizesse? O que se espera das mulheres? Que elas busquem homens no botequim e sejam chamada de "rádio patroa"? Que elas fiquem doentes emocionalmente enquanto  suportam um cara agressivo por causa de drogas, porque o amor é assim? Não temos esse poder curativo (e ainda bem, pois somos só pessoas, mesmo).

Mac Miller morreu por um monte de circunstâncias juntas, que só quem sabe de verdade são os amigos, médicos e familiares.

O que se faz agora com Ariana é muito cruel. Qualquer pessoa que perde alguém próximo sofre muito. E, além de se culpar (algo que acabamos fazendo), as pessoas vão apontar o dedo e te chamar de "assassina"? Quanta covardia! Ninguém pode ser responsabilizado pelos atos dos outros (sejam homens ou mulheres).

Agora, guardem esse conselho: mulher alguma "salva" homem das drogas nem os cura de suas loucuras. Não somos curandeiras nem bruxas nem instituições para viciados. Somos pessoas, que, como todas, têm problemas. E, ah, homens também não nos curam de nada (ainda bem).

Sobre a autora

Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.

Sobre o blog

Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.