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Nina Lemos

Por um 2019 com menos mulheres criticando mulheres!

Nina Lemos

27/12/2018 04h00

Foto: Getty Images

Faça uma experiência. Vá até o Google e digite a frase: "é criticada". Você vai encontrar mulheres sendo criticadas por tudo. Por ir à praia com a filha e ela aparecer "meio queimada", por sentar de perna aberta, por exibir dobrinhas na barriga, por usar muito biquíni, por voltar a trabalhar pouco tempo depois de ter um filho, por ter celulite, por usar pouca maquiagem, por usar maquiagem demais… Uma loucura.

Se antes quem criticava eram meus colegas jornalistas de fofoca (muitos deles passavam o verão buscando celulites em fotos de moças na praia), hoje, o trabalho foi democratizado. O Instagram é a nova revista de fofocas. E, ali, todos criticam. Curioso ver que muitas mulheres passam parte do dia criticando outras mulheres.

Todo mundo vira candinha da vida alheia e, claro, todos sabem tudo. A tal história da moça criticada por levar a filha à praia é real. A atriz Letícia Almeida foi detonada depois que fez uma foto com a filha de 1 ano na praia na véspera de Natal. Motivo: segundo algumas seguidoras, a menina aparecia meio vermelhinha (dizem, eu não consigo enxergar): "passe protetor!", disse uma. "Olhe essa bebê toda vermelhinha", disse outra. A atriz rebateu e explicou que, sim, passou protetor.

Todo mundo sabe que a patrulha que ronda as mães é algo insuportável. Todos acham que sabem o que é melhor para uma criança. Mãe nasceu para ser criticada, coitada. E agora, em que todos ganharam essa voz democrática, elas são criticadas por voltar cedo demais ao trabalho, por voltar à forma muito rápido, pela maneira como seguram a filha. Noto que a maioria das críticas vem de mulheres. Como pode?

Vale lembrar que ninguém vai criticar um homem por voltar ao trabalho muito rápido depois de ter filho. E se, em uma foto, o filho aparecer "meio vermelhinho", ele vai ser lembrado de jeito fofo para passar protetor. Afinal, ele está com o filho na praia, olha que incrível. Provavelmente, as críticas não vão ser tão agressivas como as que recebem as mulheres. Nesse caso, elas são raivosas. Como aquelas que recebemos de algumas pessoas quando nosso  cadarço está desamarrado na rua: OLHA, CADARÇO DESAMARRADO!

Fecha essa perna!

Ser criticada por passantes do Instagram e em comentários de internet não é privilégio das mães, claro. A atriz Bruna Lynezimer, também agora, na temporada natalina, foi criticada por postar uma foto em que aparece com a perna meio aberta, tipo, sentada, tipo, normal. "Fecha essa perna, menina!". E, sim, quem disse isso foram mulheres. Reproduzindo o padrão de que menina tem que sentar bem comportada. Bruna já deve estar acostumada, afinal, ela é uma das mais criticadas: por não raspar de baixo do braço, por não raspar a perna…

No caso dos homens, a aparência deles ou o jeito que seguram os filhos e essas coisas pequenas do dia a dia, costumam passar batido. Eles são criticados, claro, inclusive por mim, mas, em geral, por coisas sérias, como declarações homofóbicas ou racistas. Seus pelos não costumam chamar a atenção dos maníacos das críticas (e espero que continue assim, ninguém merece essa patrulha chata).

Tudo estaria sob controle se o hábito das mulheres criticando mulheres estivesse só na internet. Mas reparem nas fofocas de Natal, por exemplo. Em geral, é a fulana que estava mal-vestida, a beltrana que engordou (como se isso fosse um problema)…

Por que mulheres fazem isso? Não acho que seja porque odiamos umas as outras. Talvez seja por arrogância (sei mais, logo, sou melhor mãe). E, muitas vezes, por reprodução do machismo. Ouvimos tanto que temos que fechar a perna quando sentamos que passamos a ordenar outras mulheres para que façam o mesmo.

Parar com isso não é difícil. Preste atenção em si mesma. Se autocensure. E, pense, se você está criticando outras moças, existem outras criticando você também. Dá para mudar isso em 2019, queridas. Vocês conseguem.

Sobre a autora

Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.

Sobre o blog

Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.