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Nina Lemos

Ninguém merece ser alvo de um ataque "de humor" violento de Danilo Gentili

Nina Lemos

11/04/2019 13h10

Em 2013, escrevi um artigo em outro site, onde tinha um blog, criticando a forma de humor de Danilo Gentili. O texto chamava: "A Danilogentilização e o humor que aponta o dedo".

Eu falava de uma piada que ele tinha feito com uma doadora de leite materno, comparando-a com um ator de filme pornô. Na época, a moça, que fazia um ato nobre, teve suas fotos divulgadas pelo humorista. Depois disso, sua vida virou um inferno.

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Eu citava esse caso e outros, feitos por outras pessoas. E criticava uma forma de humor que mais parecia bullying. Fazer crítica de TV, humor e comportamento faz parte do meu trabalho. Mas, claro, eu não xingo ninguém.

Bem, um dia acordo e minha vida tinha virado um inferno. Danilo Gentili tinha encontrado um Twitter meu antigo elogiando um político que era odiado. Copiou esse Twitter e escreveu: "essa é a jornalista que não gosta dos meus fãs".

Eu jamais tinha falado mal dos fãs dele, mas de um tipo de humor, veja bem.

Ele distorceu tudo e colocou sua turba de milhares de seguidores atrás de mim. Naquele dia (e nos que se seguiram) fui xingada de todas as palavras que vocês podem imaginar no mundo. Eram milhares de mensagens me chamando de puta, vadia, ladra e por aí vai. Claro, alguns, empolgados, partiram para a violência e escreviam coisas do tipo: "ela merece apanhar".

Do Twitter, passaram para meu Facebook e meu Instagram. Os comentários ofensivos chegaram até às crianças que tinham fotos postadas no meu perfil. Fechei todas as mídias sociais por aqueles dias e chorei, fiquei desesperada. Parecia que eu estava em um corredor polonês infinito.

Drama? Mimimi? Você até pode achar, mas eu não sei se você já sofreu um massacre na internet. Dói. Muito. Dói fisicamente.

Desde então, Danilo Gentili é bloqueado nas minhas redes sociais e evito escrever o seu nome por medo (sim, eu sou humana).

Ontem, quando li a notícia de que ele foi condenado a seis meses e 28 dias de prisão em regime semiaberto pela 5ª Vara Federal Criminal de São Paulo por injúria à deputada federal Maria do Rosário, lembrei da minha experiência. Sim, essas coisas a gente nunca esquece.

Danilo é condenado por ter escrito uma série de tweets ofendendo a deputada e feito um vídeo onde esfregava um pedido de conciliação extrajudicial enviado pela Procuradoria Parlamentar da Câmara dos Deputados nas partes íntimas. O crime: injúria.

A situação é toda absurda. No fim do vídeo, ele fala para Maria do Rosário "abrir as pernas e enfiar os papéis no meio da b…". Isso é humor?

Segundo a juíza federal Maria Isabel do Prado, Danilo injuriou Maria do Rosário "ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro, atribuindo-lhe a alcunha de 'puta', bem como expôs, em tom de deboche, a imagem dos servidores públicos federais e seu respectivo órgão". Ela entendeu que ele passou do limite.

Desde ontem a noite, Gentili está nos trend topics do Twitter e milhares o defendem falando que o que ele fez foi liberdade de expressão. Minha amiga Flavia Penido, advogada, tentou clarear a situação e escreveu:

"Pessoal, sobre a decisão: há diferenças entre criticar, mesmo que duramente, uma pessoa, e ofendê-la." E continuou: "Há uma certa flexibilidade quando falamos de figuras públicas (mais expostas a críticas, ainda mais políticos), mas não, não pode ofender. Então, você pode dizer: não concordo com as posições da Flavia e acho que ela é uma péssima advogada. Mas você não pode dizer que a 'Flavia é uma anta burra que não sabe escrever uma notificação'. Em resumo, não pode xingar o coleguinha."

Sim, a sociedade precisa de leis que balizem a civilização da barbárie, acho.

E não acho certo que, por exemplo, jornalistas como eu se sintam intimidados na hora de escrever sobre alguém porque pode ser atacado. E, sim, confesso, escrevo esse depoimento com medo. E quem quiser achar que é mimimi… tudo bem. Não te desejo um ataque de ódio na internet mesmo assim. Ninguém merece.

Sobre a autora

Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.

Sobre o blog

Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.