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Nina Lemos

"Megxit": Meghan é tratada como destruidora do lar real. A culpa é dela?

Nina Lemos

09/01/2020 14h30

Getty Images

"Megxit". É assim que parte da imprensa da Europa e dos Estados Unidos está chamando a "saída" do príncipe Harry e de Meghan Markle da vida de obrigações (e privilégios) da família real inglesa. Megxit é uma brincadeira com o Brexit (o controverso movimento político que pode fazer com que o Reino Unido deixe a União Europeia). Meghan seria, por essa lógica, a responsável por uma quebra sem precedentes, por uma mudança na ordem mundial. Para os amantes da família real, uma vilã. Para seus fãs, uma heroína. E Harry? Bem, sua decisão parece ser o que menos importa, apesar de… O príncipe ser Harry, oras!

Para quem não viu o escândalo. Harry e Meghan anunciaram ontem que vão se afastar da família real, ser independentes financeiramente e morar entre a Inglaterra e a América do Norte. Em outras palavras, os dois declararam que abandonariam a vida na corte, as obrigações reais e viveriam uma vida de plebeus (dentro do limite de celebridades reais, claro). Se a notícia é uma bomba em se tratando de uma das famílias mais famosas e poderosas do mundo? Claro!

Todos nós adoramos (falo por mim) acompanhar a vida da família real. O casamento dos dois, ano retrasado, foi assistido por milhares de pessoas no mundo todo. E, em seguida, eles continuaram nos noticiários. Quer dizer, mais precisamente, Meghan, que passou a ser o alvo principal da imprensa de fofocas. 

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O casal teria brigado com o outro casal real, formado por William e Kate. Do que se falou? De uma possível briga entre Kate e Meghan. Sobre a possibilidade de dois irmãos reais estarem se estranhando ninguém pensou ou comentou. Claro, as culpadas são as mulheres. Essa é a dramaturgia dos romances antigos e das novelas.

Agora, ela se repete. Meghan, essa "manipuladora", teria criado uma confusão na família real. A imprensa inglesa fala sobre a rainha arrasada de tristeza. Sobre o príncipe Charles tomado pela fúria. Todos muito decepcionados com o casal que eles tão "bondosamente" acolheram.

Estão magoados com Harry, mas principalmente com Meghan, essa megera, que entrou na família para causar discórdia. Ou seja, a demolidora de lares, esse personagem tão antigo, ataca outra vez.

Harryxt?

E Harry? Se querem fazer uma piada, porque não chamam o caso de "Harryxt"? Afinal, foi ele que nasceu com sangue azul. A avó rainha é dele, não da esposa. Ela não foi criada para seguir obrigações reais, ele sim. Mas, claro, a culpa é da mulher, esse ser capaz de deixar os homens loucos. Essa lógica não é boa nem para os homens, que seriam uns bananas, liderados por esposas que mandam neles. 

Quem acompanha um pouco as fofocas da família real, assistiu ao seriado "The Crown" e leu livros sobre a família real sabe que aquilo ali não é um conto de fadas. Casamentos são decididos por conselhos, que se metem na vida privada das pessoas. Até a escola onde uma criança vai estudar pode virar um assunto de Estado.

Ao casar com Harry, Meghan teve que abrir mão do trabalho, apagar redes sociais. E, inclusive, deixar de usar calça comprida. Sim, essa é uma família onde mulheres não têm nem esse direito. 

Há alguns meses, Harry veio a público implorar que sua esposa fosse respeitada. Isso porque, além de tudo, ela estava sendo alvo de racismo. Harry já sofreu ameaças de um grupo neonazista e foi chamado de "traidor da raça". Meghan passou a sofrer bullying da imprensa enquanto suas amigas denunciavam que ela estava era sendo vítima de racismo.

Quem é maluco e destruidor de vidas? Um sistema desses, com a imprensa de fofocas mais agressiva do mundo, ou a duquesa?

Eles tomaram a decisão e vão cumprir. Mas, para Meghan, vai ser difícil se livrar da fama de "destruidora da família real".  Seria ótimo se eles conseguissem explicar que tomaram a decisão em conjunto. Ajudariam a quebrar mais um tabu.

 

Sobre a autora

Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.

Sobre o blog

Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.