Topo

Nina Lemos

Medo de parecerem frágeis faz homens usarem menos máscaras. Pode isso?

Nina Lemos

15/05/2020 04h00

Crédito: Pondsaksit/ iStock

"Vamos enfrentar o vírus como homem, pô". A frase, entre muitas outras absurdas, foi dita pelo presidente Jair Bolsonaro. Como todos sabem, ele acha que o coronavírus, que já matou cerca de 300 mil pessoas no mundo, é só uma gripezinha. E que no caso dele, "com seu histórico de atleta", não teria nada sério se contaminado, mas apenas um "resfriadinho". Afinal, ele se acha "macho".

Bolsonaro é conhecido por furar quarentena, abraçar admiradores, tudo sem máscara. Ele passou a usar a proteção (indicada pela Organização Mundial de Saúde) apenas quando virou lei no Distrito FederalO presidente é um dos mais famosos negacionistas do Coronavírus do mundo e um machista clássico, caricatural.

Veja também:

Mas desdenhar do poder da doença não é exclusividade dele. Pode ate acontecer com aquele nosso amigo "inteligentão".  Eu já desconfiava, mas agora cientistas provaram que homens usam menos máscara que as mulheres. Um estudo feito em parceria entre as universidade de Sussex, na Inglaterra, e Berkeley, nos Estados Unidos, comprovou que homens têm mais resistência a usar máscara durante a pandemia.

Esses homens que se recusam a usar máscara não são todos negacionistas como o presidente. Alguns até acreditam no vírus, mas se acham menos vulneráveis. Para eles, usar máscara é algo "vergonhoso, ridículo e sinal de fraqueza". Ou seja: por conta da tal masculinidade tóxica, eles se sentem "menos homens" usando máscara. 

Sim, a masculinidade pode ser tão frágil que transforma homens feitos em crianças do pré-primário que se recusam a usar um tipo de roupa "porque meus amigos vão rir de mim."

Além do medo de ser ridículo aos olhos dos amiguinhos, alguns parecem achar que o fato de serem "machos" (seja lá o que isso signifique) seja capaz de expulsar um vírus do corpo. Eles devem achar que são tão fortes que assustam o coronavírus. Sim, é uma maluquice. Mas também é sério.

Estudos mostram que os homens são mais atingidos pelo Coronavírus que as mulheres e morrem mais da doença. Um dos motivos, segundo os estudiosos, são as diferenças sociais entre homens e mulheres. 

"Coisa de viado"

Eu conheço caras inteligentes que não usam cachecol e passam frio por achar que o acessório "não é coisa de homem." Juro. Se alguém passa frio para "não parecer menos macho", faz sentido que eles também não usem máscara. Imagino que muitos, com a masculinidade tão frágil, não possam conceber fazer coisas como lavar as compras com álcool-gel. Coisa de mulherzinha, né? Ah, claro, muitos desses "machos"  têm mulheres que fazem isso para eles. 

Obviamente, não estou falando de todos, mas dessa pressão de "ser macho" que atinge muitos deles.  Homens, por exemplo, vão menos ao médico que mulheres. Segundo o Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos, as americanas vão 33% mais ao médico que os americanos. Afinal, além de serem super-heróis, eles não gostam de demonstrar fraqueza ou de pedir ajudar. Isso, na verdade, chega a ser triste.

De vez em quando aparece uma pesquisa mostrando como a masculinidade tóxica faz mal para a humanidade. Recentemente, li que homens têm dificuldades de ter atitudes ecologicamente corretas porque acham que reciclar lixo não é coisa de macho. E que usar ecobag é coisa "de mulherzinha". Afe.

Sim, essa mentalidade infelizmente ainda existe. Machismo mata. Se você é homem e estiver lendo esse texto: tome vergonha na cara! Use máscara — e não vale ser pendurada no queixo!

Sobre a autora

Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.

Sobre o blog

Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.