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Nina Lemos

Guilherme de Pádua em manifestação bolsonarista é a cara do Brasil 2020

Nina Lemos

25/05/2020 11h58

Reprodução Instagram

"Se Deus quiser, o Brasil vai mudar". Quem disse a frase, reclamando da corrupção no país, foi o ex ator Guilherme de Pádua, que foi condenado pelo assassinato da atriz Daniella Perez, morta em 92, com 18 tesouradas. Daniella tinha 22 anos quando foi a morta pelo ator Guilherme de Pádua, com quem fazia par romântico na novela "De Corpo e Alma". Glória Perez, mãe de Daniella, era a autora do folhetim. No crime, Guilherme contou com a ajuda de sua então esposa, Paula Thomaz.

Guilherme, autor de um crime hediondo de feminicídio, foi ontem, junto com a mulher, à manifestação em Brasília em apoio ao governo Bolsonaro, contra o STF e contra o isolamento social em tempos de Coronavírus. Sem nenhuma vergonha e totalmente seguro de si, o ex ator postou uma série de vídeos posando de patriota, cidadão de bem orgulhoso, vestido de verde e amarelo até os pés.

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Esse tipo de manifestação tem sido chamada de "carreata da morte" (por serem protestos contra o isolamento no momento em que o Brasil tem cerca de 365 mil casos confirmados e mais de 22 mil mortes causadas pela COVID-19). A presença de um assassino como Pádua em uma manifestação dessas combina. Quem representa melhor um "evento da morte" do que o assassino de uma mulher de 22 anos? 

Em algumas manifestações, cidadãos dançam com caixões, em uma marcha sinistra desrespeitosa com os mortos, seus parentes e amigos. Agora, temos Guilherme de Pádua posando de bom cidadão, um desrespeito não só com a família de Daniela e seus amigos, mas com todas as mulheres vítimas desse tipo de crime. 

Como alguém mata uma mulher de 22 anos a facadas e depois posa de bom cidadão?

Em vídeo postado hoje no Instagram, Guilherme de Pádua fala como se fosse um cidadão exemplar, alguém que estivesse "lutando pelo bem" e que, inclusive, tivesse na posição de julgar os outros e dar conselhos para "o povo brasileiro.  "O que me impressiona é que tem pessoas que estão torcendo para que tudo dê errado. Torcendo para que o Brasil se aprofunde em uma crise. Torcendo até pelo vírus. Para que ele mate mais pessoas.. Eu não entendo como uma pessoa pode torcer pelo seu próprio país. Contra seu próprio bem estar e das pessoas que a gente ama. É insano."

Um assassino falar que quem é a favor do isolamento social torce pela morte é, realmente, como disse Pádua… insano. 

Em outro vídeo, ele saúda o presidente, junto com a esposa. E grita, junto com outros manifestantes: "sou brasileiro, com muito orgulho, com muito amor."

Parece filme de terror que alguém como Pádua grite essas frases de saudação à pátria em um momento em que o presidente é conhecido como o maior negador do Coronavírus do mundo e o Brasil é o maior foco da infecção, 

Guilherme, pelo que dá para ver em seu Instagram e Youtube (ele tem mais de 30 mil seguidores) é um ferrenho defensor do fim do isolamento social. Ele chegou a fazer um vídeo onde, com ares científicos, fala teorias contra o confinamento. Seus pensamentos não serão replicados aqui.  Afinal, quem é Guilherme de Pádua? Médico? Especialista em saúde pública?

Não, ele é o assassino de Daniela Perez. E responsável também por destroçar sua mãe, a novelista Glória Perez e seus outros familiares. E, agora, quase 30 anos depois, ele aparece para falar de "família". Sim, segundo sua análise, a manifestação tinha "ambiente familiar." É o fim dos tempos. E que sensação de impunidade é essa que faz com que alguém como Guilherme de Pádua saia na rua orgulhoso, se junte com populares e ainda ache que é exemplo? É insano. E a cara do Brasil de 2020.

Sobre a autora

Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.

Sobre o blog

Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.