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Nina Lemos

O que podemos aprender com o pedido de desculpa de Marcela à Dilma?

Nina Lemos

29/05/2020 04h00

Reprodução/TV Globo

"Queria pedir desculpas para a Dilma Rousseff. Essa é uma dor que eu carrego". Quem disse a frase foi a ex-BBB Marcela McGowan, em live feita com a ex-deputada Manuela d'Ávila. Motivo do pedido de desculpas: em 2013, Marcela, então apenas uma médica não famosa, usou o Twitter para fazer ataques baixos a ex-presidente.

Na época, ela escreveu: "Dilma passa mal no meu plantão? #meusonho "Dilma, sua ditadora ridícula!" E teve até mais. A médica, então com 24 anos, fez piadas sobre matar a ex presidente. Poderia até ter sido presa. 

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O tempo passou. Marcela ficou famosa e cresceu. E se arrependeu. Na live, ela pediu para que Manuela, amiga de Dilma, mandasse para a ex presidente seu pedido de desculpa. "Que bom que você está fazendo isso, Marcela", disse Manuela, que se dispôs prontamente a mandar o recado. 

A médica se explicou: "Eu fui uma pessoa alienadíssima política até 2018. Em 2018 foi a primeira vez que eu olhei para a política. Antes disso eu era aquilo que a gente se chama de massa de manobra. Reproduzia discursos. Fiz falas totalmente irresponsáveis. Ainda bem que eu tinha zero influência.. Tenho um grande arrependimento. Fica aqui minhas desculpas públicas em relação a ela. Tenho uma grande admiração por ela. Mas esse sentimento veio tarde. "

Marcela ganhou o apelido de "fada sensata" no BBB 20, uma expressão bem complicada, já que em geral vem acompanhada da seguinte expressão: "fada sensata que nunca erra". Nunca errar? Isso existe? Alguém é sensato o tempo todo? Impossível! E nossa, que pressão… 

Quando falamos que alguém não erra, estamos também prontos para "cancelar" quem comete um erro. Vacilou? Acabou. 

No mundo real, que não tem nada de encantado, a gente erra, aprende, erra de novo. E sente, sim, até muita vergonha dos erros. 

Mas não é tão fácil assim admitir. Por isso, Marcela deu, sim, uma lição de sensatez, e que não tem nada a ver com não errar. Sensatez é ter coragem de admitir que errou e pedir desculpas. 

Quem não muda? E aprende? Ou a gente pensa uma coisa e tem que ficar para sempre repetindo o que pensava antes só para não ter que dar o braço a torcer?

Essa não é a primeira vez que Marcela pede desculpas. Desde que saiu do BBB, ela tem feito isso o tempo todo. Ela já pediu desculpas logo que saiu. Ao saber que foi acusada de racismo (pela maneira com que tratou o ator Babu, em alguns momentos falando que tinha "medo" dele), ela se surpreendeu. E disse: "Foi um choque pra mim porque eu nunca me vi nesse lugar. Eu tenho noção de como a gente é racista como sociedade em geral, mas eu nunca tinha enxergado. E é um lugar que eu quero muito olhar", disse ela.

Vamos dar a real. Se você é branco em uma sociedade racista, você já teve atitudes racistas, sim. Quando a gente percebe isso, se assusta? Sim, mas melhor admitir, aprender e tentar a mudar, não?

Na live com Manuela (que foi muito boa, se você tem preconceito com quem participou do BBB também pode mudar de opinião) as duas falaram muito sobre "não deixar as pessoas congeladas no erro."

A médica não é fada sensata (inclusive, vamos lembrar, isso não existe) mas não deixa de nos dar um exemplo. Desculpas, como diziam nossas avós, foram feitas para se pedir. Bom lembrar disso nessa hora em que nosso uso da internet cresceu 40% por cento e estamos trancados em casa.

Afinal, quanto mais usamos as redes, mais brigamos e caímos no risco de cancelar. Não precisa ser assim. Um viva para as fadas que erram.

Sobre a autora

Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.

Sobre o blog

Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.