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Nina Lemos

No Dia das Mães, confissões de uma "sem filhos"

Nina Lemos

13/05/2018 04h00

 

 

Se você é mulher adulta e não tem filhos (nem vai ter, meu caso) você é minoria. Nem estou falando da opressão, que até existe. Mas de números mesmo. Somos cerca de 38% da população feminina, segundo dados de 2014. A mesma pesquisa, realizada pelo IBGE, mostra que na faixa etária entre 40 e 49 anos somos cerca de 12%.

Mesmo assim, somos estudadas como uma tendência que só cresce, uma moda de comportamento. Ganhamos até nome em inglês para nos rotular: "child free". A expressão significa literalemente "livre de crianças". Segundo ativistas da "causa", livre é melhor que sem, já que livre não denota uma falta. Resumindo: não temos filho por opção.

Posso não ter filhos e fazer parte das estatísticas, mas não gosto nem um pouco dessa expressão "child free". Ficar livre de crianças? Tô fora. Adoro crianças, sejam meus enteados, minha afilhada, filhos dos amigos, passantes com quem faço amizade em festas (as crianças em geral são mais legais que os adultos, por isso, em geral, costumo preferir brincar com elas).

Mas então por que não fui (e não vou ser) mãe? Porque não rolou. Não deu tempo. Estava ocupada fazendo outras coisas.

Há uns dez anos, quando eu ainda pensava em ser mãe, fiz uma entrevista com a atiz Patricia Pillar. Perguntei se ela já tinha tido vontade de ser mãe. "Acho que não, porque se eu tivesse tido vontade de verdade, eu teria sido."

Patricia não sabe, mas essa frase resolveu para mim essa questão. A partir desse dia, entendi que se eu não tenho filho é porque eu não quis.

Se eu tivesse tido vontade DE VERDADE de ser mãe, eu teria sido.

Já quis muito. Já quis médio. Não tive.

Tudo isso não quer dizer que eu não tenha inveja dos homens que podem ser pais aos 60 anos. Genética desgraçada. Se eu fosse homem teria a chance de mudar de ideia!

"Mas você pode adotar!" Claro, poderia e acho o máximo. Incentivo todas as amigas a fazerem isso. Só que provavelmente eu não vou fazer. Isso porque…. eu não quero ter filhos. Eu gosto da minha liberdade, imagina,um bebê agora? Não! Socorro!

Um bebê custaria caro, tudo na minha vida ficaria mais complicado, eu nunca mais poderia mudar carregando apenas duas malas de … não. A minha vontade não é tão grande assim.

Por isso, sim, fiquei para titia. E, não tô me gabando, todo mundo sabe, eu sou uma ótima tia. Tipo a melhor tia do mundo.

"Minha heroína"

Mesmo sendo assim, bem resolvida (hahahaha) O Dia das Mães, admito, não é fácil para muitas de nós que não passamos por esse "grande momento", "esse dia que mudou a minha vida", "a hora em que eu finalmente entendi a vida" (como dizem muitas mães, e nós, se entendemos alguma coisa, foi chorando, no analista mesmo).

A gente abre o Facebook e lá estão mensagens para heroínas que nós, as sem filho, nunca seremos. Declarações para a melhor mãe do mundo que nunca seremos nós. Não é bom ser uma mulher sem filhos no Dia das Mães, principalmente pós Facebook.

Inveja? Acho que sim. Afinal, lá estão guerreiras, mulheres que "me deram a oportunidade de ser pai" , "mulheres mais importantes da vida", "mulheres mais amadas do mundo."

Sim, eu, mulher sem filhos, bem resolvida com isso, sou a chata do Dia das Mães e evito entrar no Facebook "para não me irritar", o que prova que não sou tão bem resolvida assim.

Mas vocês, mães, são totalmente bem resolvidas? Não!

Vocês às vezes se acham péssimas, têm vontade de ser alguém sem filhos pelo menos por 10 minutos…

Então, me desculpe, Cazuza ,mas nem as mães são felizes. Ninguém é.

Feliz Dia das Mães. Para todas nós.

Sobre a autora

Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.

Sobre o blog

Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.