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Nina Lemos

Dia da Criança: queremos ferro para meninos e roupa ninja para meninas!

Nina Lemos

10/10/2018 04h00

Foto: Getty Images

Quando eu era criança, existia uma boneca chamada Amelinha. Ela se referia àquela música que fala: "Amélia é que era mulher de verdade, Amélia não tinha a menor vaidade". Era, basicamente, uma boneca de uma dona de casa submissa e sofredora: ela já vinha com avental, rodo e tábua de passar. Parece piada. Mas isso existiu. Nunca tive uma. Era pequena demais (Amelinha foi lançada em 1973). Sou da geração Fofolete, umas mini bonecas que vinham em caixa de fósforo (nunca entendi essa "morada", mas na época também eram vendidos chocolates em forma de cigarro). Sim, eles eram loucos.

Amelinha morreu ainda nos anos 1970. E, apesar dela, uma geração de mulheres cresceu independente, teve filhos, sobrinhos e quer educá-los de forma diferente. Sexta-feira é Dia da Criança. Estamos em 2018. O que queremos? Uma geração de meninos e meninas que sejam livres para brincar do que quiserem. E que cresçam independentes desses esterótipos dos anos 1950 de que a recatada e do lar fica em casa enquanto o homem vai trabalhar. Principalmente porque não é assim. A realidade é que a maioria das mulheres brasileiras, sim, trabalha fora (infelizmente, grande parte ainda faz jornada dupla, cuidando também da casa, mas é isso que queremos mudar, certo?). Investiguei as ofertas de brinquedos para ver se elas acompanham essas mudanças. Encontrei poucas surpresas.

Tábua de passar para todos!

Nos sites das grandes lojas de brinquedo, existe um kit vassouras para menina, cor-de-rosa. Não acho nada errado que menina brinque de varrer, inclusive, esse é um aprendizado para a vida. Mas pensei: puxa, podia ter um kit para meninos, não? Não existe. Mas existe um "unisex", vermelho, que você pode comprar (inclusive as crianças que estão aprendendo a andar amam varrer). Nesse Dia das Crianças, compre uma vassoura para o seu filho. Ele vai adorar.

Outra coisa que acho uma boa para meninos: tábua de passar. Isso porque, em geral, homens usam camisas que precisam ser passadas mais do que nós, mulheres. Mas, não, o kit de passar roupa é "indicado para meninas" na seção da loja (e é rosa). Alô, fabricantes de brinquedos, bora pensar em fazer um ferro unisex! Vamos deixar os meninos brincarem de passar! E que eles não cresçam achando que vai ter alguém que vai fazer isso para eles, pelo amor de deus. Ser autônomo é bom para todos!

A discrepância quando a gente procura "brinquedos de meninas" e "brinquedos de meninos" ainda é gigante. Para meninas, vemos kit de lavar louça (rosa, claro) escrito: para meninas. Poxa! Precisa dividir assim? Meninos também podem (e quando crescer vão precisat) lavar a louça. Isso é o mínimo! Ao mesmo tempo, na parte dos meninos, existe um kit para "meninos ninjas." Pô, as meninas também querem ser ninjas, inclusive porque as mães delas, que trabalham, ainda cuidam da casa e dos filhos: elas são ninjas!

Mas nem tudo está perdido. Na minha busca, encontrei kits chef de cozinha, com embalagem com menino e menina na capa. E cozinha para que meninos e meninas brinquem juntos, sem rótulos. Ufa! Que sirva de exemplo. E também um carro esporte lindo para meninas, que, como se sabe, quando crescerem também vão dirigir! E muitas meninas adoram carros.

Que esses pequenos avanços continuem, e que, no ano que vem, os brinquedos sejam ainda mais democráticos. Viva as crianças!

Sobre a autora

Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.

Sobre o blog

Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.