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Caso do cantor de forró: por que mulheres defendem agressores?

Nina Lemos

24/08/2018 04h00

Mais um caso de violência contra a mulher nos assustou essa semana. Como agora temos internet e acesso a imagens de câmeras de segurança, cenas do que, infelizmente, é supercomum aparecem cada vez mais.

A terrível imagem da semana é a do vocalista da banda Brilhantes do Forró, Francisco Luciano dos Santos, conhecido como Luciano Brilhante, agredindo sua ex-mulher, Anna Augusta Josuá, durante uma briga dentro do elevador do seu prédio.

Tudo fica pior quando a gente sabe que ele cometeu a agressão na frente do filho de seis anos. E que a ex diz que tinha ido até sua casa cobrar a pensão do filho.

Mas, calma. Ainda é mais desconcertante: a ex o acusa de agressão e denunciou o caso na delegacia. E qual foi a estratégia de defesa do cantor? Luciano colocou dois depoimentos em seu Instagram de mulheres falando que ele era legal: um de uma outra ex-mulher, Jessica Karine, mãe de uma das suas filhas, e um da atual, Renata Santos (que viu a agressão, aparece nos vídeos tentando separar e ainda leva uns empurrões).

Nas "entrevistas", a ex diz que nada justifica a agressão mas que "ele teve que fazer aquilo". A atual fala que ele é "um bom pai e um bom filho."

Como assim? Como uma mulher pode dizer que um homem teve que puxar uma mulher pelos cabelos?

Síndrome de Estocolmo

Não estávamos lá, mas só de ver as imagens já dá vontade de gritar: "Corra, Lola, corra!" Um homem é acusado de agredir outra mulher e você vai defendê-lo? O que acontece?

Impossível saber de toda a história. Mas certas mulheres parecem sofrer de uma espécie de Síndrome de Estocolmo (apego ao agressor-sequestrador) e saem defendendo os homens que oprimem mulheres, como se elas também não fossem oprimidas. Não conseguem se livrar do apego ao "algoz."

Quantas mulheres a gente já viu dizendo que "ele não é o que a ex diz"? Ou que "a ex dele que é maluca"? O discurso é aquele: "o sujeito, coitado, é explorado pela ex folgada, afinal, como ele mesmo disse, ele não é um monstro."

Sim, em entrevista, Francisco admitiu que a pensão estava alguns dias atrasada e disse que não era nenhum "monstro". E que a mulher "era violenta, ia quebrar sua casa."

Não, ele não é um monstro. Infelizmente, ele é um ser humano, um pai de família, um desses sujeitos (são muitos) que "perdem a cabeça" e agridem mulheres. Agressores de mulheres estão por aí, do seu lado, no trabalho, no ônibus…

Eles não são "monstros", mas cidadãos de bem com atitudes monstruosas. As moças que os defendem colaboram com a tese de que "coitado, ele perdeu a cabeça" ou "a outra é maluca." Como se tivesse alguma coisa no mundo que justificasse um homem agredir uma mulher. Se for, digamos, o caso de uma pessoa realmente violenta em surto, o indicado é chamar médicos ou a polícia.

"Síndrome de reabilitação"

Infelizmente, não é raro o caso de mulheres que relativizam agressão. Sim, já vi mulheres de idades variadas falando que "coitado, não era bem assim." E, claro, pensar o clássico: "comigo vai ser diferente."

É claro que um homem agredir uma mulher não significa que ele agrediu todas com quem esteve na vida (ou vai agredir). Mas, repito, ele é acusado de agredir uma mulher (e existem imagens!). Isso é mais do que o suficiente (ou devia ser) para deixar qualquer outra mulher chocada. O que fazer?

Esperar que as defensoras de agressores acordem (isso, muitas vezes, acontece) sem marcas (literalmente).

E, não custa lembrar: agressão a mulher é muito sério. Se aconteceu com uma, pode acontecer, sim, com você. E, não, você não vai mudá-lo (sim, muitas de nós sofrem da 'síndrome de reabilitação' e saímos por aí achando que vamos consertar homem). Desculpem a sinceridade, mas isso não dá certo.

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Sobre a autora

Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.

Sobre o blog

Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.