Caio Blat de saia: como a masculinidade do homem brasileiro é frágil!
Nina Lemos
22/04/2019 17h17
"Ator Caio Blat passeia usando saia com a namorada Luiza Arraes". Bem, quando li essa notícia, achei que ela era meio parecida com o clássico "Caetano estaciona carro no Leblon". Um ator passear com a namorada é o que nós, jornalistas, podemos chamar de uma não-notícia. Não tem nada importante ou que chame a atenção aí. Mas, bem, ele estava de saia. E aí, nossa!
(Foto: AgNews)
Continuo achando que um ator dar rolê com a namorada no fim de semana usando saia não é uma notícia, assim, importante. A notícia, acho, é o quanto isso ainda causa choque. O que pensei quando vi a foto do moço, muito de boa, em todos os lugares foi: nossa, mas como a masculinidade do homem brasileiro é frágil!
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Qualquer coisa que um cara faça que fuja do padrão do "macho" causa choque, curiosidade e, por isso mesmo, vira notícia. Homem de saia é uma dessas questões que mostram que, como me disse uma vez uma amiga, nada no mundo é mais frágil do que a masculinidade de um homem.
A questão da saia é uma dessas pequenas coisas que abalam essa coisa mais frágil que a leveza do ser. Há anos, estilistas colocam homens de saia na passarela. Há anos, a moda não pega. Eu, pessoalmente, acho lindo e sexy. Mas não cola. O homem que tem coragem de usar saia está desbravando um território hostil, sendo supercorajoso. E não estou sendo nada irônica. É preciso, sim, coragem, já que ele vai ser julgado, olhado, perseguido por olhares de outros homens e provavelmente ouvir "gracinhas" de outros caras.
Caio não é o primeiro, nem vai ser o último cara a causar espanto por usar uma saia. Em 2016, foi a vez de Bruno Gagliasso. E, escuta, nem era saia de verdade, era uma kilt (a saia tradicional escocesa, aquela que o príncipe Charles sempre usa) e era no baile de Carnaval da Vogue. Gente!
Nesse ano, fora do Brasil, teve quem ousasse mais. A saia (e outros modelos incríveis para homens) foi um hit na cerimônia do Oscar. O ator Billy Porter, por exemplo, arrasou de vestido de gala desenhado por Christian Siriano. Já o ator Jason Momoa foi com um smoking rosa de veludo que… aff, que beleza. Ah, sim, gostar de moda e se vestir bem é uma das coisas que muitos homens deixam de faze rem nome da "masculinidade". Chega a dar um pouco de pena.
Será que a masculinidade frágil está saindo de moda? Não sou, assim, tão otimista. Mas acho que muitas mulheres, como eu, acham mega sexy homem de saia, unha pintada, lápis no olho. Tem coisa mais legal do que gente que não segue padrão e tem coragem?
Usar saia é, sim, um ato de coragem, visto que conheço homens que dão exemplos de masculinidade frágil do estilo:
- Não usar cachecol. Sim, eu já tive essa discussão com amigos, que preferem passar frio, porque acham que usar cachecol "não é coisa de homem."
- Se recusar a fazer xixi sentado
- Não usar rosa
- Não dançar bem
A lista é infinita.
O assunto volta e meia aparece no Twitter. Hoje mesmo, era discutido no site, de novo, o fato de um homem afirmar que fazia xixi sentado e por isso "ser chamado de viado" . E nada, nada no mundo mostra mais o quanto a masculinidade é frágil do que o medo de ser chamado de "viado". Qual o problema? O que teria de mal nisso? Outro dia mesmo eu, mulher hétero, fui chamada de sapatão na rua. Se isso me abalou? Não! Eu apenas pensei, puxa, que babaca, se eu fosse gay isso poderia ter doído porque isso é homofobia. Qual seria a minha reação se eu fosse um homem hétero padrão? Sair na porrada?
Já escrevi sobre o drama do xixi aqui. Os caras ficaram tão, mas tão possessos comigo, como se eu falasse, sei lá, que eles deveriam apanhar.
Sim, há que ter coragem para ser homem e falar que faz xixi sentado, que dorme na mesma cama que um amigo, que gosta da Britney Spears… Repito, chega a dar pena dos caras. Deve ser uma vida chata tendo que se privar tanto.
Por isso, mirem-se no exemplo do Caio, que não precisa provar nada para ninguém. E ah, não estou falando que TODOS OS HOMENS TÊM QUE USAR SAIA. Não precisam ficar nervosinhos….
Sobre a autora
Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.
Sobre o blog
Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.