Anitta, Emicida, Felipe Netto: artistas se posicionarem agora é obrigação
Nina Lemos
12/05/2020 04h00
Reprodução/ Instagram
"Eleja um assassino e espere um genocídio. Essa é a nossa realidade. Aquele mesmo verme que comparou quilombola a animal está sentado na cadeira de presidente." A frase, forte, foi dita pelo rapper Emicida na live que fez no último domingo, dia 10. Durante mais de oito horas, o rapper cantou seus maiores sucessos, levantou dinheiro para a "Central de Mães da Favela" e disse várias vezes: "Bolsonaro inútil".
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Emicida é um artista político. Nunca escondeu suas opiniões e sempre se posicionou. Mas, no mesmo fim de semana e nos últimos dias, outros artistas fizeram o mesmo, e alguns deles não são NADA acostumados a falar sobre temas "polêmicos."
Acontece que a situação mudou. O número de mortes por conta do coronavírus não para de crescer no Brasil. Os absurdos do governo idem. Esses artistas estão percebendo que cobrar medidas que minimizem a tragédia é obrigação de quem tem público e seguidores.
Caso de Anitta
A cantora, que costuma ser cobrada por não se posicionar politicamente, veio com tudo. Fez uma live sobre política com a amiga Gabriela Prioli, advogada e comentarista da CNN. No vídeo ao vivo, Anitta fez perguntas sinceras, daquelas que muitos cidadãos comuns gostariam de fazer. As duas discutiram, por exemplo, a diferença entre os poderes e a confusão que isso causa no combate ao coronavírus. "Você está dizendo que quem defende o isolamento apresenta medidas. E que o presidente não apresentou um plano. E só quando o hospital ficar lotado vai fazer isso, esse é o problema?", perguntou a cantora para a amiga. Sim, Anitta, é isso. E que legal ver esse assunto sendo discutido assim! Elas falaram, inclusive, sobre impeachment, de um jeito acessível, que qualquer um pode entender.
No domingo, a cantora fez outra live. Dessa vez, cantou e arrecadou mais de um milhão para o mesmo movimento que Emicida, "A união de mães da Favela" e para a CUFA (Central Única das Favelas).
Anitta é um exemplo e tanto no momento e você não precisa gostar da música dela para admitir isso. Mostra como os famosos com muita influência (Anitta tem quase 14 milhões de seguidores no Youtube e 46,8 milhões no Instagram) podem fazer muito a diferença em um momento desses. Outros artistas e influenciadores brasileiros poderiam fazer o mesmo.
Até Roberto Carlos!
A situação é tão séria, que até Roberto Carlos, conhecido por NUNCA se posicionar, muito menos quando o assunto é polêmico, disse em sua live no domingo que era a favor do "isolamento total".
Sim, o assunto é polêmico. Apesar da ideia do isolamento social ser a indicação da Organização Mundial de Saúde, o presidente Jair Bolsonaro é contra e alguns dos seus fãs também. Inclusive, manifestações contra o isolamento acontecem toda semana. Ontem, caminhoneiros se manifestaram contra o isolamento na Avenida Paulista.
Roberto Carlos foi corajoso. Em tempos tão polarizados, se você tiver uma opinião, alguns fãs podem ficar com raiva de você e até te boicotar. Sabe aquele senhor que acha que o comércio tem que abrir de todo jeito e que "só vão morrer uns velhos"? Essa pessoa pode ficar com raiva do Rei, parar de consumir seus produtos e de seguir sua carreira.
Mas, falando sério, uma pessoa com influência hoje em dia pode NÃO correr esse risco? Existe essa opção? Ninguém aqui está falando em partido, de jeito algum, mas em se posicionar claramente a favor de medidas que salvem vidas das pessoas.
Em um momento como os que estamos vivendo, um artista ou influenciador que fica em casa só reclamando de quanto isso é difícil (e, sim, é, mas existem tragédias maiores) e fazendo lives de vez em quando para animar quem está em quarentena, sinceramente, faz pouco.
Em certas horas, ficar calado é complicado.
Também no durante o último final de semana, Felipe Neto publicou um vídeo conclamando famosos e influenciadores a se manifestassem contra o fascismo. "Acabou a tolerância, não dá mais. Se você fica calado você é cúmplice", disse o youtuber, que há cerca de um ano passou a dar muitas opiniões políticas. "Não dá para ficar em cima do muro", ele disse. Felipe avisou também que tinha dado unfollow em famosos e influenciadores que se calavam."
Alguns famosos já estão fazendo se posicionando. Quanto aos outros, se continuarem em silêncio, será que eles sairão desses tempos tão influentes como eram antes? A ver…
Sobre a autora
Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.
Sobre o blog
Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.