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Nina Lemos

Renata Fan e Photoshop: pressão estética atinge até quem tem corpo padrão

Nina Lemos

29/01/2020 04h00

Reprodução Instagram

Elas são lindas. Têm o corpo considerado perfeito, aquele padrão que é vendido como o ideal, sem gordura, barriga tanquinho, magras (sim, um padrão tóxico). Mas, mesmo assim, parecem não se sentir felizes dentro da própria pele. E vão nas redes sociais, onde todo mundo tem que ser perfeito e colocam Photoshop nas suas fotos para ficarem ainda mais dentro do padrão. Como se isso fosse necessário (e possível).

A "photoshopada" da vez é a apresentadora Renata Fan, que postou uma foto no Instagram de biquíni (linda, claro). Mas como se não bastasse a lindeza, ela foi lá e diminuiu a cintura com algum desses programas que são usados para alteração de imagem. Os fãs perceberam. Alguns a ridicularizaram. Outros falaram a verdade: ela não precisa. Por que fazer isso?

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Renata não é primeira, nem a última, nem a única a usar filtros e Photoshops para tentar se adequar a um padrão já estando dentro do padrão. São muitas as influenciadoras e blogueiras que fazem o mesmo. Centenas.

No Réveillon, foi a vez de Rafaella Santos, irmã de Neymar, "derrapar no Photoshop". Em uma foto na praia, também de biquini, seu umbigo desapareceu. Ela precisava disso? E, na verdade, quem precisa? Se não está confortável com o seu corpo, não poste foto, simples. E, mais importante, por que não tentar ficar confortável com o seu corpo?

 Que tipo de pressão absurda é essa que faz com que mulheres (até as mais dentro do padrão) vejam defeitos em suas fotos? E o que isso pode causar na cabeça das seguidoras das influenciadoras?

Bem, as meninas mais novas, mais suscetíveis a essas imagens, vão sair em busca de um corpo impossível de alcançar. E, não só porque não é do biotipo delas, mas porque simplesmente… esses corpos não existem! Eles estão sendo manipulados. Seria igual querer ter o corpo da Barbie. Impossível.

É horrível ir até o Instagram das pessoas (em 99% dos casos isso acontece com mulheres) e as atacar, seja porque elas têm celulite, seja porque estão magras demais, e também porque abusaram na correção das fotos. Patrulha em cima do corpo de mulher é condenável, assim como piadas. Dito isso, acho que as influencers e celebridades deviam, primeiro, pensar (e aceitar) que elas estão com problema de imagem. 

Existe até uma doença chamada dismorfia corporal, que acontece quando a pessoa se olha no espelho (hoje em dia, nas fotos) e vê uma outra pessoa, só focando nos defeitos. Não, não estou dizendo que todas sofrem disso. Estou falando que o assunto é sério e pode virar doença se você não se tratar ou tentar mudar. Ou elas vão viver para sempre insatisfeitas, vendo problema onde não tem? Isso não pode ser bom para elas.

E também não é bom para os outros. Renata Fan tem quase cinco milhões de seguidores. Rafaella Santos, mais de cinco milhões e meio. Na hora que fazem isso, podem afetar milhares de outras mulheres, que vão se achar imperfeitas, correr para o Photoshop, o que vai fazer outras mulheres fazerem o mesmo, em um ciclo sem fim. 

Uma pesquisa da Sociedade Americana de Psicologia, realizada em 2018 com mulheres entre 18 e 35 anos, concluiu que fotos de fitness e beleza aumentavam de forma significativa os problemas de autoestima e autoimagem entre as seguidoras e que uso excessivo da rede poderia causar sintomas como insatisfação corporal e ansiedade.

Acho que as "vítimas do Photoshop", como muitas vezes elas são chamadas em tom de chacota, são vítimas mesmo. Vítimas de uma sociedade que prega a superperfeição. E, claro, também acabam, com seus Photoshops e filtros, alimentando essa sociedade da mulher "perfeita, sem defeitos".

Ou seja, isso não é bom para ninguém. Nem para elas. Nem para quem as segue. Deve ser bom para os cirurgiões plásticos, para as indústrias de estética, para os que vendem remédios milagrosos e toda uma indústria (da qual as influenciadoras fazem parte) que se alimenta das "encanações" femininas com seus corpos.

Hora de pensar, refletir. E tentar mudar as coisas.

Sobre a autora

Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.

Sobre o blog

Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.