Homem com horror de feminismo: você tem certeza que ser machão é legal?
Nina Lemos
09/01/2019 04h00
Foto: Getty Images
Quando eu era pequena, com mais ou menos uns oito anos de idade, lembro de olhar para os meninos na escola e pensar: "Ainda bem que eu nasci menina". Não que a minha vida fosse moleza. Mas eu não queria, de jeito algum, ter que brigar, não chorar, jogar esportes violentos (ok, queimada não é exatamente um esporte violento, mas meu pavor de qualquer jogo com bola era tão grande que aquilo parecia para mim uma coisa perigosa, tipo uma guerra).
Mesmo eu, menina, me sentia obrigada a jogar queimada (e sempre era a última a ser escolhida para o time). Mesmo eu sofria um certo bullyng por ser péssima em esportes.
Mas… E se eu fosse menino? Eu apanharia se fosse ruim demais, eu teria que participar daquelas brigas horríveis (não, não era nada, mas para mim qualquer amontoado de pessoas parecia ser muito perigoso, mais que a queimada). Por isso, passei minha infância com esse alívio por ser menina. Não, eu não sabia o que me esperava pela frente. Eu não sabia que quando crescesse ia ganhar menos do que os homens, que seria menos valorizada nas coisas que fizesse etc. Mas isso não vem ao caso.
Compartilho essas memórias de infância porque, nesse momento, em que nós, mulheres que se autodenominam feministas, somos demonizadas, como se fôssemos pessoas superperigosas, que saem por aí sem depilar a axila e fazendo coco no chão (sim, rolou essa fake news), fiquei pensando que é impressionante que os homens ainda tenham tanto medo da palavra feminismo por um motivo simples: eles também se ferram com a cultura machista.
A sociedade, assim, dividida no rosa e no azul, naquele esquema onde existe coisa de menino e coisa de menina, é boa para os homens? Acho que não. Tudo bem, vocês, caras, têm muitas vantagens. Mas as desvantagens são gigantes.
A tal masculinidade tóxica
Na masculinidade clássica, também conhecida como masculinidade tóxica, você não pode chorar no banheiro do trabalho, não pode admitir que tem medo.
Você tem que ser o pegador, porque homem que é homem tem que pegar um monte. Ai dos tímidos, que, no caso, têm que inventar causos nas rodas dos machos. Atenção, estou falando nesse mundo padrão macho antigo, nesse que muitos parecem querer de volta enquanto gritam no Twitter: vamos banir o feminismo das escolas!
Esse mundo ainda existe, e os caras têm que se preocupar com coisas como o tamanho do seu pau. E, se for traído, além de ficar triste, você ainda vai ser chamado de corno. Uma tristeza.
Conheço caras que chegam ao ponto de não usar as roupas que querem, porque elas podem não ser "de homem". Ou passam frio porque macho que é macho não usa cachecol!
Esses são exemplos reais. Coisas que ouvi outro dia. Nessas horas, concordo com a minha amiga Rita Wainer, que diz que deve ser muito chato ser homem. Imagina viver em um mundo cheio de "não podes" que você mesmo se impôs? Que porre!
E o que o feminismo tem a ver com isso? Tudo, queridos. Se nos recusamos a ser belas, recatadas e do lar, também não esperamos que vocês sejam machões que não choram e pagam todas as contas e precisam ter carro (sério, ainda tem gente que acredita nisso).
Venham para a luz, Carolinos! No fim, vai ser bom para todos vocês.
Sobre a autora
Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.
Sobre o blog
Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.