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Thelma atacada em live: lutar contra racismo não é frescura ou "lacração"

Nina Lemos

28/05/2020 04h00

Imagem: Artur Meninea/Globo/Divulgação

"Vão se f*, turma da lacração".  "Essas negras são muito frescas". Esses comentários, junto com outros, igualmente criminosos, foram feitos na noite de terça-feira enquanto a médica Thelma Assis, vencedora do BBB 20, fazia uma live com a editora de moda Luanda Ferreira, da revista Glamour, também negra. Foram tantas ofensas que a live teve que ser interrompida. Segundo Thelma, isso acontece sempre.

Palavras dela,durante a live:  "Queria pedir licença para as pessoas que estão nos assistindo para denunciar os comentários racistas. Estamos aqui falando de racismo estrutural e ainda tem gente que tem coragem de colocar comentários racistas numa live tão importante como a nossa. Quem gosta da gente e está aqui de maneira respeitosa por favor, denunciem. Tem acontecido em todas as minhas lives e mostra que realmente, sim, vivemos em um país racista."

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Um detalhe nos ataques me chamou atenção. Os termos usados:  "frescas", lacração". Essas expressões viraram uma espécie de moda bizarra no país e são usadas largamente pelo presidente Jair Bolsonaro, sua família e apoiadores  do governo.

Quem se levanta contra o racismo, a homofobia e outras formas de discurso de ódio prática"vitimismo", é "fresco", é da "turma da lacração". No caso do racismo, por mais que a turma do ódio chame de "mimimi", não adianta: é crime mesmo.

No mesmo dia do ataque a Thelma e Luanda, jornalistas de empresas como o Globo, UOL e Folha de S. Paulo pararam de ir ao Palácio do Planalto participar de entrevistas coletivas por problemas de segurança, depois dos repórteres serem atacados. O presidente Jair Bolsonaro declarou o seguinte sobre o fato: "Estão se vitimizando". Qual a diferença de falar que é frescura?  Nenhuma.

Turma do politicamente correto, vitimismo, turma da lacração. Esses termos viraram clichê na mão de grandes partes dos brasileiros.  Quando alguém começa uma frase com uma dessas palavras, pode se preparar. Em geral, vão reclamar de quem fala que racismo é crime (e é) , que homofobia também devia ser e dizer que ofender os outros é "liberdade de expressão."

Sim, essas pessoas que vomitam ódio nunca estiveram tão empoderadas. Afinal, eles têm no poder pessoas que também falam esse tipo de coisa. Eles estão fazendo muito barulho. Não surpreende que eles usem racismo aberto para atacar uma mulher como Thelma.

Em alguns comentários sobre a notícia do ataque, alguns leitores continuavam na mesma tecla. "Ai, essas feministas chatas." "Nossa, é muito mimimi." É desolador.

Só que nem tudo está perdido. Isso porque também existe uma outra turma, formada por Thelma e milhares de mulheres como ela, que não vão se calar. O outro lado que aceite: Thelma é médica. E campeã do BBB 2020. E negra. E racismo, repito, é crime. Leia abaixo a resposta de Thelma às agressões (após o ocorrido, a  #ThelmaMereceRespeito ficou entre as mais comentadas do Twitter) publicada por ela ontem, 27/5:

"Eu não entendo como existem pessoas que ainda não se conscientizaram que racismo é crime e que internet não é terra de ninguém. Duas mulheres pretas falando sobre representatividade, superação e principalmente sobre a importância de atitudes antirracistas. Muito obrigada pela tag de apoio, me emocionei. Todos nós merecemos respeito. Não vamos nos calar!". Certíssima.

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Sobre a autora

Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.

Sobre o blog

Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.