Expectativa: sair da pandemia melhor. Realidade: brigas inúteis na internet
Nina Lemos
03/09/2020 04h00
Crédito: Khosrork (iStock)
No início da pandemia, quando ainda achávamos que poderíamos sair dessa melhores, muitos de nós passaram a fazer cursos online e assistir lives de artistas (uma novidade lá em março, quando pensávamos que tudo se resolveria em no máximo dois meses.) Entre uma live e um curso, fazíamos algo em que nos viciamos desde que as redes sociais foram criadas: brigávamos, discutíamos e nos metíamos em polêmicas.
Seis meses se passaram. A pandemia não acabou. Ainda fazemos cursos e assistimos live. Mas, em vez de termos nos tornado pessoas melhores, as polêmicas invadiram as lives. E cursos passaram a ser motivos de briga.
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Ontem, a advogada e apresentadora Gabriela Prioli foi parar nos trend topics do Twitter. Motivo: o curso de "política racional" oferecido por ela por 500 reais. Muitos reclamavam do preço e do conteúdo oferecido. E, como sempre acontece nas redes, outros reclamavam de quem reclamava. Ou seja, até os cursos, que viraram mania durante a pandemia já entraram na lista de polêmicas. O que vai ser da gente até a vacina sair?
Desde que a quarentena começou, um amigo que está há cinco meses trancado em casa em São Paulo assiste as lives da cantora Teresa Cristina religiosamente. Essa é a salvação do período de isolamento dele e de muita gente. Pois bem, ele me contou que várias polêmicas estão rolando na live mais famosa de todas. Na segunda-feira, de acordo com ele, o músico Henrique Cazes cantou uma música machista e foi criticado. Depois, discutiu o politicamente correto de Noel Rosa com Teresa Cristina e a coisa esquentou.
Ou seja, se as tretas invadiram o espaço sagrado e contemplativo das lives… Não existe mais espaço online onde não haja briga. Brigamos no Twitter, no Facebook, no Instagram e… em chats de lives!
Brigar pra quê?
Não é por acaso que estamos brigando tanto e muitas vezes por causa de polêmicas idiotas (como essa do curso da Prioli – quem acha caro e bobo é só não fazer, certo?). Com a pandemia, o uso da internet cresceu 50% no Brasil, segundo os provedores do serviço. As redes sociais colecionam recorde de tráfico e de lucro. O Facebook, por exemplo (grupo dono também do Instagram e do WhatsApp) dobrou seu lucro. O aumento do uso, segundo a empresa, foi de cerca de 40%.
Esse tempo extra online também colabora com o aumento das fake news e sua propagação. Na segunda-feira, os jornais tiveram que explicar que as fotos da praias cheias no Rio de Janeiro e em Santos (SP) eram reais.
Nesse dia, as brigas atingiram grandes decibéis. "Briguei com vários desconhecidos por causa da foto", diz uma amiga. E sei que isso é verdade. Ao entrar no Twitter e dar uma busca no assunto, flagrei vários posts dessa amiga discutindo com desconhecidos.
No meu caso, no início da pandemia, larguei o Facebook. Me orgulhava disso como um ex-fumante que largou o cigarro depois de dez anos de uso. Até que tive uma recaída da qual não consigo mais sair.
Segundo os especialistas, a vacina só deve chegar no ano que vem. Como vamos sobreviver até lá? Em períodos normais, eu falaria para você dar uma volta quando achar que está brigando demais nas redes sociais. Mas, nos dias atuais, essa frase pode virar outra grande polêmica, já que "dar uma volta" também virou motivo de discussões acaloradas…. Então, fique em casa. Se puder, se quiser. E não briguem mais que o inevitável para extravasar um pouco do desespero.
Sobre a autora
Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.
Sobre o blog
Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.