Filhos de Bolsonaro e assessores não são "meninos" que fazem "brincadeiras"
Nina Lemos
18/06/2020 04h00
Reprodução Instagram
"Gabinete do ódio é piada, eu conheço os meninos". Quem disse isso foi Karina Kufa, advogada do presidente Jair Bolsonaro. Ela se referia ao grupo de assessores que cuida das redes sociais e campanhas online do presidente e que seria comandada por um de seus filhos, o vereador do Rio de Janeiro Carlos Bolsonaro.
Os tais "meninos" seriam amigos de outros "garotos", todos com mais de 30 anos, que são investigados na operação que investiga ataques e fake news feitos, por exemplo, a ministros da Suprema Corte.
Meninos? Brincadeira?
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Esse tratamento às pessoas do governo não é novidade. O presidente costuma se referir aos filhos como "os garotos". Seria normal se fosse só um tratamento familiar. Mas não, em mais de uma ocasião, ele se referiu aos filhos dessa maneira depois, como se fossem crianças bagunceiras, de eles cometerem erros que tem consequências ao Brasil.
Em 2018, Eduardo Bolsonaro, então com 34 anos, deu uma declaração onde falava em fechar o Supremo Tribunal Federal. Na ocasião, Jair Bolsonaro disse: "já adverti o garoto. No caso, fui até duro." Na última semana, foi a vez de Carlos Bolsonaro. Depois de xingar colegas em um grupo de whatsApp de vereadores do Rio de Janeiro, ele teria prometido ao pai que iria "se comportar".
Mas, espera! Estamos falando de homens adultos. Carlos Bolsonaro tem 37 anos e é vereador do Rio de Janeiro. Seus irmãos, Flávio, de 39 anos, é senador, e Eduardo, 35, deputado federal. Ou seja: além de não serem crianças na idade, ocupam cargos públicos, foram eleitos como representantes do povo (e não do grêmio escolar).
A vida pública (e a vida adulta em geral) não é um lugar onde o seu pai pode te dar uma bronca, você fala que vai se comportar e fica por aí. Prometer se comportar fica para as crianças de quatro anos. Adultos se controlam, e, caso contrário, respondem pelos seus atos.
Quem nunca?
Infantilizar homens adultos é uma atitude normal na sociedade que vivemos. Mesmo nós, mulheres, às vezes tratamos nossos parceiros, pais e amigos como se eles fossem crianças incapazes de cuidar de si mesmos. "Ah, ele faz bobagem, coitado". "Ah, se eu não estou por perto ele não se alimenta direito". Acontece, às vezes sai. E nos policiamos para não agir assim porque não é bom para ninguém.
Mas tudo fica pior quando se trata de pessoas importantes na política do país, que ajudam a definir os rumos da nação. E, no caso dos acusados de produzir fake news e contratar robôs, como os tais "meninos" do Gabinete do Ódio, ainda são pessoas acusadas de crimes sérios.
A vida pública não pode ser um espaço onde um homem feito é tratado como uma criança que faz molecagem. Democracia é um assunto seríssimo. Não é brincadeira de criança. E, não, não tem nenhuma criança trabalhando no Senado, no Planalto ou em Câmara de vereadores. São adultos. Não meninos.
Sobre a autora
Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.
Sobre o blog
Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.