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Negra é candidata a vice nos EUA: o mundo está acordando. E o Brasil?

Nina Lemos

13/08/2020 04h00

Depois que o nome da senadora Kamala Harris foi anunciado como candidata a vice-presidente dos Estados Unidos na chapa de Joe Biden, do partido Democrata americano, quase todos os analistas foram unânimes: a senadora foi uma excelente escolha. E, com ela, o candidato tem mais chances de ganhar as eleições, derrotando Donald Trump.

Kamala é formada em direito e, além de senadora, foi procuradora. Sua carreira é brilhante. E Kamala é uma mulher negra, descendente de jamaicanos e indianos. Ou seja, ela representa as mulheres, os imigrantes e a comunidade negra. Em tempos de Black Lives Matters, nunca foi tão importante ter uma pessoa negra como candidata. E, com movimentos como o #MeToo e todo o apelo do feminismo atualmente, também nunca foi tão importante ter uma mulher em um cargo tão importante. 

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O macho adulto branco sempre no comando 

Devia ser óbvio que mulheres e negros fossem representados igualmente na política. Afinal, a democracia, pelo menos teoricamente, é o governo do povo. Votamos em nossos "representantes". Como uma sociedade em que cerca 30%  das pessoas é latina ou negra, feito os Estados Unidos, pode ser representada apenas por homens brancos?

Democracia significa "homens brancos governando?" 

Na imensa maioria das vezes sim. Por isso, foi tão significativa a vitória de Barack Obama como presidente de um dos países mais importantes do mundo. 

Só 4% dos eleitos no Brasil são negros

E o Brasil? Vamos começar a falar sobre isso? Quando veremos algo assim acontecer? A julgar pela situação política atual, falta muito, mas muito mesmo. Sabe qual é a proporção de negros eleitos para cargos públicos em 2018 no Brasil? 4%. Vou repetir: qua-tro-por-cen-to. 

Sim, também fiquei estarrecida com esse número, apesar de não exatamente surpresa. 

No caso das mulheres, melhora um pouco (contém ironia):  somos 15% no congresso. Entre prefeitos, somos 12%. É chocante. No governo atual há apenas 2 mulheres ministras (o total de pastas é de 22) e nenhum negro no ministério. 

Tudo fica mais absurdo quando a gente olha para os números do Censo do IBGE. O Brasil tem mais  56% da população negra (juntando o número dos que se consideram negros ou pardos. Nós, mulheres, também somos maioria (51, 8%). Mas, quem se importa com isso?

"Dilmanta?"

Sim, o Brasil teve uma presidente mulher, Dilma Rousseff, que sofreu impeachment em 2016.

Será que o fato dela ser mulher não pesou? Alguém se lembra de todos os ataques machistas que ela sofreu? Para refrescar a memória, ela era chamada de "DilmAnta" e de "Dilmalouca" . Em certo momento, algumas pessoas fizeram um adesivo dela de pernas abertas que foi colocado em tanques de carro, simulando um estupro. A questão aqui não é preferência política, mas respeito as mulheres mesmo.

Joe Biden tem 78 anos. Então, a expectativa é que, se ele ganhar, não se candidate para a reeleição. Kamala poderia ser a primeira mulher presidente dos Estados Unidos. Uma primeira presidente mulher negra e descendente de imigrantes.

As mulheres (finalmente) estão muito lentamente ocupando espaço na política. Durante a epidemia do Coronavírus, líderes como Angela Merkel (da Alemanha) e Jacinda Ardern (da Nova Zelândia) tem se destacado na liderança do combate à epidemia.

O mundo, muito lentamente, começa a ver que mulheres e negros precisam ocupar cargos de poder. Quando isso vai acontecer no Brasil? É hora de termos essa conversa.

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Sobre a autora

Nina Lemos é jornalista e escritora, tem 46 anos e mora em Berlim. É feminista das antigas e uma das criadoras do 02 Neurônio, que lançou cinco livros e teve um site no UOL no começo de 2000. Foi colunista da Folha de S. Paulo, repórter especial da revista Tpm e blogueira do Estadão e do Yahoo. Escreveu também o romance “A Ditadura da Moda”.

Sobre o blog

Um espaço para falar sobre a vida das mulheres com mais de 40 anos, comportamento, relacionamentos, moda. E também para quebrar preconceitos, criticar e rir desse mundo louco.